segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

21 de Janeiro

A Narrativa do Anticomeço


“El- Khazazharakbattar destrói o Início de Tudo” – e quem o escreveu não era gente pequena. Uma improvável tradução búlgara desta epopeia narrativa do começo do mundo caiu nas mãos de um romeno meio fascistinha chamado Mircea Eliade, que a traduziu (trabalho de má qualidade, pois tradução da tradução) e escreveu opúsculo sobre ela, o qual incluiu como apêndice da segunda edição de seu clássico O Mito do Eterno Retorno, distribuída nesta data.

No El- Khazazharakbattar (por ele traduzido como O Começo do Início dos Recomeços) o mundo começa numa ordem. Há deuses, senhores, servos e escravos, todos felizes, as montanhas em ordenado círculo e as águas sem se misturarem com os ares. Sem que a própria narrativa seja muito clara a respeito, em algum ponto os homens querem tomar terras e trigo dos outros homens, os machos batem nas fêmeas, alguns homens põem coroas na cabeça e cobram impostos, e os ares se revoltam contra as águas em furacões e as águas devolvem secas e o chão gera terremotos.

As epopeias (todas) se sucedem em irritante monotonia – em todas há uma passagem do Caos para a Ordem, feita por um Herói. A epopeia Amhitar transforma a Ordem em Caos, obra de Ninguém. Mais adequada ao amargo homem moderno, talvez, e que contrariava as próprias conclusões de Eliade, preso às epopeias tradicionais. Nenhuma honestidade é absoluta, nem mesmo a intelectual, e o sábio retirou a incômoda epopeia Amhitar das edições ulteriores de seu clássico.

Nenhum comentário:

Postar um comentário