Era meia-noite quando Leon,
depois de condenar 17 contrarrevolucionários à morte e completar três laudas de
Uma análise dialética do futuro da
mais-valia espreguiçou-se, levantou de sua escrivaninha no trem blindado
que servia de comando ao Exército Vermelho e saiu para tomar ar. [A guerra
civil afinal caminhava bem – apenas nove mil e novecentos mortos nos últimos
dias, uma bagatela].
Distraído pela emoção de estar
construindo a redenção do mundo e pela neblina, perdeu-se e quase bateu a testa
no Velho Cachorrão [o mais sujo dos
bordéis de Amhitar e do mundo].
Três bêbados o convidaram a uma
mesa. Leon frio e fome não tinha rublos. Eles pagaram o pão e a vodca.
Mas
exigiram:
- Cante.
O orgulho proletário bateu firme
em Leon. O alcoolismo é uma desgraça do
povo oprimido.
Não se deixaram convencer. Canta
ou nada.
Leon Trotsky engoliu o orgulho [a
fome deva pontadas]. Grasnou:
- Figaro, Figaro, Figarooo...
Não gostaram. Fechou os olhos,
pediu para Marx perdoá-lo:
- Anushka/ a minha puta/ tinha quatro tetas/ sete tetas/ nove tetas...
Trabalhadoras da noite e bêbados
riram. Leon comeu, bebeu, gargalhou, moças sentaram nos seu colo. Os comissários
da Artilharia Vermelha que o encontraram lhe sentiram o bafo de álcool.
Depois, numa noite em 1940, numa
casa fortificada no México, Leon Trotsky escreveria: somente um dia, naquele dia 4 de maio de 1920, posso dizer que fui
realmente feliz.
Vinte e quatro horas depois morreu
assassinado.
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