Hoje em 1859 [em uma crise
causada por um (temido) vazio de ideias e pela milésima-terceira discussão com sua doce
eterna namorada Louise Colet], Gustave Flaubert [lamentavelmente] rasgou todas
as 499 páginas que escrevera de seu romance Le
Ciel Gris Foncé, O Céu Cinza Escuro. Dessa triste cena não quedaram
testemunhos [tudo o que se sabe vem de um relato posterior do seu aluno Guy de
Maupassant].
Amhitar entra nesta cena [tão]
parisiense. Aborrecido por lidar com advogados e tribunais depois de processado
pelo Madame Bovary, Flaubert resolveu
se refugiar [ao menos literariamente] o mais longe. Vaporosos relatos lhe
revelaram um reino longe, para lá do mar de Aral. Com entusiasmo de iniciante [e
alternando com noitadas pouco castas com Louise Colet] em questão de meses o
escritor já tinha um resumo e quatro capítulos da história da paixão de uma
princesa amhitariana por um rebelde mercenário. A Amhitar flaubertiana continha
zebras, coroas de trezentos quilates de diamante, florestas tão densas que um
mosquito não podia penetrar – tudo o que Amhitar não era.
A realidade, porém, continuava a
mesma. O ministério dos negócios estrangeiros francês reclamou que o livro
poderia atrapalhar seu jogo geopolítico na Ásia Central. Em fúria, Flaubert rasgou
as páginas e fugiu dessa vez ao passado – e escreveu Salammbô, a história de uma princesa cartaginesa. Fragilizado,
escreveu um bilhete a Louise Colet dizendo que ainda a amava.
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